Entenda as particularidades de um DRE para empresa de SaaS. Avalie a performance financeira de sua empresa de SaaS.
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O modelo de negócio de SaaS é diferente da indústria e do comércio tradicional. Assim, é interessante levar em conta suas particularidades ao analisar sua performance financeira.
O propósito desse post é ilustrar como uma Demonstração de Resultado do Exercício (DRE) customizado para SaaS pode te ajudar nesse sentido. Para tal, vamos relembrar rapidamente o que é o DRE, a diferença entre o DRE Contábil e o Gerencial e entre os regimes de caixa/competência. Em seguida, descreveremos um exemplo de Demonstrativo de Resultados para SaaS. Vamos lá?
A AgileMS é um ERP desenvolvido exclusivamente para empresas de SaaS. Esse post faz parte do Blog onde compartilhamos melhores práticas de gestão de SaaS.
Nota: o conteúdo desse artigo é meramente ilustrativo não deve ser tomado como instrução ou aconselhamento profissional. Consulte seu contador e advogado antes de tomar decisões relacionadas a esse tema.
O que você quer aprender?
- 1 O que é DRE (Demonstração do Resultado do Exercício)?
- 2 Qual é a diferença entre o DRE Contábil e o DRE Gerencial?
- 3 Qual a diferença entre o regime de caixa e competência?
- 4 Por que elaborar o DRE para uma empresa de SaaS é diferente?
- 5 Como estruturar um DRE (Gerencial) para empresas de SaaS?
- 6 Conclusão
O que é DRE (Demonstração do Resultado do Exercício)?
Trata-se de um relatório contábil que comunica o resultado (lucro ou prejuízo) da empresa em um determinado período. Toda empresa é obrigada a produzi-lo por lei:
Artigo 1179 do Código Civil:
“O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico [i.e. DRE].”
O formato do DRE também é determinado por lei. O artigo 187 da Lei 6.404/1976 estabelece quais informações e em que ordem o DRE deve mostrar:
(+) Receita Bruta: vendas ligadas a atividade da empresa (p. ex., Setup e SaaS). Outras receitas (p. ex. multas) devem ser registradas em conta separada.
(-) Deduções de Receita Bruta (ex. descontos comerciais e impostos sobre receita)
(=) Receita Líquida
(-) Custo de Mercadorias ou Serviços Vendidos
(=) Lucro Bruto
(-) Despesas Operacionais
(=) Lucro Operacional
(+/-) Receitas e Despesas Não Operacionais
(=) Resultado do Exercício Antes do IR e CSLL
(-) Provisão Para o IR e CSLL
(=) Lucro Líquido
Qual é a diferença entre o DRE Contábil e o DRE Gerencial?
O DRE Contábil é preparado para cumprir as obrigações legais da empresa e seu formato é inflexível como vimos acima. Ele é produzido para uma audiência externa (p. ex. receita federal, público em geral).
O DRE Gerencial é preparado para auxiliar os gestores em suas decisões. Ele não é obrigatório, pode ser formatado livremente e é produzido para uma audiência interna.
Qual a diferença entre o regime de caixa e competência?
O “regime” se refere a forma como a empresa registra suas atividades (p. ex. vendas e despesas). Toda atividade empresarial gera um registro (também chamado de evento ou lançamento).
No regime de caixa, as receitas e despesas são registradas quando os pagamentos são recebidos/realizados (i.e., quando o dinheiro entra ou sai da conta bancária). Por outro lado, no regime de competência, receitas e despesas são realizados quando ocorrem de fato (p. ex. quando você efetivamente presta ou recebe um serviço).
Para avaliar a performance da empresa, é interessante usar o regime de competência pois vincula receitas e despesas ao mesmo período. Por exemplo, suponha que vendeu uma assinatura em janeiro e deu prazo de 30 dias para o cliente pagar. Nesse mesmo mês, seu provedor de hospedagem lhe deu 60 dias para pagá-lo. Para avaliar a performance de janeiro corretamente, é preciso registrar a receita e a despesa em janeiro. Isso facilita a análise do desempenho do seu negócio sem “poluir” os dados com condições comerciais. O DRE é confeccionado pelo regime de competência.
Por outro lado, o regime de caixa também é importante pois reflete o dinheiro que a empresa realmente tem a disposição. Essa informação é fundamental para entender a capacidade da empresa em pagar suas contas (i.e., liquidez). Por exemplo, se a empresa vende a prazo, pode estar registrando um bom volume de vendas, mas não ter dinheiro para pagar salários e contas do mês.
Por que elaborar o DRE para uma empresa de SaaS é diferente?
Elaborar o DRE em empresas de SaaS pode ser um desafio porque o seu modelo de negócios é diferente do modelo tradicional da indústria e do comércio.
Por exemplo, ao contrário de um comércio, não há compra e venda de mercadorias. Portanto, não há um valor definitivo para Custo de Material Vendido (CMV). De fato, em uma empresa de SaaS, o CMV é a soma dos custos associados à manutenção do software e da base de clientes existente como veremos mais adiante.
Como estruturar um DRE (Gerencial) para empresas de SaaS?
Frequência
É interessante montar e analisar o DRE mensalmente para identificar tendências e problemas rapidamente. Em empresas em crescimento, isso é mais importante pois recursos são escassos e a margem para erros é pequena. De fato, podemos dizer que, para companhias de 2-5 anos, demonstrativos trimestrais e anuais não são suficientes na maioria dos casos.
Granularidade da conta
Para ilustrar, vamos usar o exemplo de DRE presente nas duas imagens abaixo.
(+) Receita Bruta
A receita é separada em Receita de Assinatura e Serviços Profissionais. Receita de Assinatura é a receita recorrente de SaaS. Serviços Profissionais se refere a receitas pontuais como, por exemplo, setup / implantação e consultoria.
Essa separação é útil pois mostra de onde a receita está vindo. Se uma parte significativa da receita não é recorrente, seu faturamento pode não ser tão estável.
Em SaaS, o foco maior é na receita recorrente. De fato, muitas empresas fornecem os Serviços Profissionais a preço de custo.
(-) Impostos sobre Receita
Incluímos nessa categoria todos os tributos (ou obrigações trabalhistas) cuja base de cálculo é a receita da companhia. Por exemplo:
- ISS (Imposto Sobre Serviço) ou ISSQN (Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza): é um tributo municipal e cada prefeitura determina sua alíquota de acordo com o serviço prestado. Geralmente, vai de 2% a 5%. Para saber mais sobre ISS em empresas de Saas, leia “Retenção de ISS e CPOM: O que é, Como funciona, Em quais municípios”
- PIS/PASEP e COFINS: são tributos federais e, para empresas de SaaS no lucro real ou presumido, as alíquotas são 0.65% e 3.00% respectivamente.
Se a empresa é de lucro presumido, deixaríamos o IRPJ e a CSLL fora dessa categoria ainda que, indiretamente, esses impostos sejam um % da receita bruta.
(-) Devoluções e Descontos
Não há muito sentido em se falar de Devoluções no contexto de SaaS. Assim, vamos focar em Descontos. Há dois tipos de descontos: o Desconto Incondicional (também conhecido como Desconto Comercial) e o Desconto Condicional.
O Desconto Incondicional é aquele que não depende de evento posterior a emissão da fatura e/ou nota fiscal. Ele não é incluído na Receita Bruta. Exemplo:
Venda dos Serviços/Produtos: R$100.000,00
(-) Desconto Incondicional: R$20.000,00
(=) Valor de Venda e da Nota Fiscal (Receita Bruta): R$80.000,00
Os R$80.000,00 serão a Receita Bruta da PJ prestadora/vendedora de serviço.
O Desconto Condicional é aquele que depende de evento posterior a emissão da fatura e/ou nota fiscal. Por exemplo, o desconto dado ao pagador quando ele paga a fatura antes do vencimento. O Desconto Condicional é incluído na Receita Bruta e depois retirado do resultado através de uma despesa. Exemplo:
Venda de Serviços/Produtos: R$100.000,00
Valor de Venda e da Nota Fiscal (Receita Bruta): R$100.000,00
Desconto Condicional (Despesa Financeira): R$20.000,00
(-) Custo de Material Vendido (CMV)
O CMV engloba os custos associados a prestação do serviço/software. Essencialmente, é o que a empresa gasta para manter o software disponível e os clientes existentes. Vamos comentar os componentes mais comuns abaixo. Note que, quando nos referirmos a um determinado “Time”, estamos falando do custo total associado a equipe incluindo salários, férias, 13º, benefícios, INSS, FGTS, treinamentos, viagens, eventos, etc.
- Gastos associados a hospedagem: AWS, Azure, GoogleCloud e softwares que suportam a hospedagem;
- Gastos associados a cobrança: taxas de bancos e de meios de pagamento (p. ex., boleto e cartão de crédito);
- Time de Sucesso do Cliente (incluindo Onboarding) e Suporte
- Time de desenvolvedores alocados a funções de suporte;
- Serviços de Terceiros: software utilizado pelo time de Sucesso do Cliente / Suporte (p. ex., Zendesk, Intercom), etc.
- Parte do Time de P&D: pode-se dizer o desenvolvimento e a inovação contínua de produto são necessários não só para ampliar a base de clientes, mas também para mantê-la. Dessa forma, pode-se alocar um % (p. ex. 20%) do custo do time de desenvolvedores dedicados a novos produtos/features ao CMV;
- Outros gastos associados a manutenção dos clientes existentes e a disponibilização do software atual.
(=) Lucro Bruto
O Lucro Bruto é um dado especialmente importante em empresas de SaaS porque reflete a capacidade da empresa em gerar caixa para cobrir as despesas operacionais, incluindo Vendas e Marketing. Ou seja, quanto maior é o Lucro Bruto, maior é a capacidade da empresa em investir e acelerar seu próprio crescimento.
Para saber mais sobre Lucro Bruto, leia “Como calcular margem bruta em SaaS?”
(-) Despesas Operacionais
Despesas operacionais são aquelas diretamente associadas a operação da empresa.
- Time de vendas e despesas associadas (p. ex., SalesForce, Pipedrive, PhoneTrack, VOIP, etc.);
- Time de marketing e despesas associadas (agências ou freelancers externos, Adwords, Facebook Ads, RD, WordPress, SEMRush, etc);
- Time de P&D (% não alocado a CMV) e despesas associadas;
- Despesas Gerais e Administrativas (G&A): aluguel, luz, água, time administrativo (p. ex. recepção, limpeza, segurança, financeiro, jurídico, RH, C-suite), softwares de gestão, etc.
- Outras despesas operacionais (que não sejam Depreciação e Amortização).
(=) LAJIDA (Lucros Antes De Juros, Impostos, Depreciação E Amortização) ou EBITDA (Earnings Before Interest Tax Depreciation and Amortization.)
Na indústria e comércio tradicionais, o EBITDA é frequentemente usado para analisar a capacidade de gerar caixa e a eficiência operacional da empresa. Entretanto, em empresas de SaaS de alto crescimento, o EBITDA pode não ser efetivo nesse sentido. O alto investimento em Vendas e Marketing (V&M) frequentemente zera ou negativa o EBITDA. Além disso, os investimentos em V&M são a vista enquanto as consequentes receitas são parceladas longo de meses. Isso distorce ainda mais o EBITDA.
Dessa forma, para medir a capacidade de gerar caixa e eficiência operacional em empresas de SaaS em alto crescimento, é interessante somar V&M ao EBITDA. O resultado seria uma proxy de quanto dinheiro a companhia geraria se tirasse o pé do acelerador.
Note que V&M merece uma análise separada com métricas específicas (p. ex. CAC) pois tende a ser a maior despesa da companhia.
Finalmente, o EBITDA ainda reflete o fluxo de caixa e, portanto, pode ser usado para monitorar o cash burn da companhia.
(-) Depreciação / Amortização
Depreciação / Amortização é a perda periódica de valor dos ativos da empresa por conta de uso, obsolescência ou desgaste natural. A taxa de depreciação anual é determinada com base na vida útil do ativo e é tratada como uma despesa. O limite da depreciação acumulada ao longo dos anos é o valor contábil do ativo. Note que há limites máximos de depreciação estabelecidos por lei.
Empresas de SaaS geralmente não têm muitos ativos e os mais comuns são equipamentos (computadores, monitores, ar-condicionado, etc) e móveis. Assim, essa linha tende a ser pouco representativa. Entretanto, o tema de Imobilização & Amortização de software vs. Despesa de Desenvolvimento de Software merece uma breve discussão.
Gastos
Os gastos de desenvolvimento de software (i.e., linha de P&D em Despesas Operacionais do DRE exemplo) podem tratados de 2 formas: Imobilização de Capital (CAPEX) ou Despesa. Quando são imobilizados, os valores são adicionados aos ativos da companhia e posteriormente amortizados ao longo de anos. Quando são tratados como despesas, os valores entram imediatamente em despesa operacional reduzindo o lucro contábil da companhia.
Por um lado, pode-se argumentar que tratar como despesa reflete melhor a realidade financeira da companhia. Afinal, é um custo recorrente e deve ser registrado quando efetivamente ocorre (princípio do regime de competência). Ao imobilizar, posterga-se e “suaviza-se” o impacto desse custo no resultado da empresa pois ocorre em forma de despesa de depreciação ao longo de anos.
Por outro lado, pode-se argumentar que o software é de fato um ativo. De fato, de acordo com o FASB, uma das características do ativo é incorporar prováveis benefícios econômicos futuros. Claramente, para uma empresa de SaaS, o software é o principal gerador de benefícios econômicos. Além disso, do ponto de vista prático, pode ser interessante ter o ativo “Software” no balanço da empresa. Suponha que a empresa queira vender um de seus produtos (software ou dados) a outra companhia. Se o ativo não existir contabilmente, não há o que vender (ainda que existam de fato milhares de linhas de código e informações armazenadas em bancos de dados).
Note que imobilizar apenas para reduzir a linha de despesa e aumentar artificialmente o lucro da empresa é um truque bem conhecido. Qualquer investidor minimamente sofisticado o identificará.
Para saber mais, leia Como contabilizar software? Despesa? Imobilizado?
(=) LAJI (Lucro Antes de Juros e Impostos) ou EBIT (Earnings Before Interest And Taxes)
Em empresas tradicionais, o EBIT é uma proxy de Lucro Operacional (regime de competência) e EBITDA, de fluxo de caixa gerado pelas operações principais da companhia.
Depreciação / Amortização geralmente não são itens super relevantes em empresas de SaaS. Assim, o EBIT não tende a diferir muito do EBITDA nesse caso.
(+/-) Receitas / Despesas Financeiras
Essa linha reflete as despesas e receitas financeiras da empresa. Despesas são gastos como juros pagos e descontos de antecipação de recebíveis. Receitas são rendimentos de investimentos como CDBs e Descontos Condicionais obtidos.
Note que alocamos as taxas e descontos de meios de pagamento (boletos e cartões) ao CMV. São custos associados a coleta de pagamento (i.e., operações) de não ao financiamento da companhia.
(=) Resultado antes da CS e IR
(-) CS e IR
(=) Lucro Líquido
Conclusão
Agora você já conhece um pouco mais sobre o DRE em empresas de SaaS. Também viu exemplo de DRE gerencial que pode te ajudar a monitorar a performance de sua empresa. Assim, convido você a exercitar esse novo aprendizado. Converse com seu Financeiro e Contador sobre como como os seus DREs (Contábil e Fiscal) estão sendo produzidos e como pode melhorá-los para gerar mais insights de performance para sua empresa. O que achou desse post? Deixe seu comentário abaixo. Adoraríamos falar com você.
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